
Uma operação da Polícia Federal (PF) que mirou abuso infantil dentro das redes sociais mostrou que o perfil, criado por uma criança na internet, levou cerca de dois minutos para ser abordado por homens adultos na internet.
Em entrevista ao Acorda Metrópoles, a delegada Rafaella Vieira, responsável pelo combate a crimes de exploração sexual infantil em ambiente cibernético, detalhou o caso. Segundo ela, uma criança de 9 anos criou um perfil pessoal na rede social. Em pouco tempo -cerca de dois minutos – ela passou a sofrer tentativas de aliciamento por homens adultos.
“Era nitidamente criança, com fotos infantis, nada de imagens sensualizadas […] Não demorou dois minutos para ela ser aliciada por homens adultos. Dois minutos”, afirma.
“Nós temos até um documentário sobre isso, que mostra que não precisa nem de imagem sensualizada para ter uma abordagem de aliciamento sexual nessas redes sociais. Homens abordando, mandando imagens pornográficas e tentando se aproxima e iniciar o processo de sedução que antecede o estupro virtual”, complementa.
Rafaella, além de alertar para o aliciamento em si, também chama a atenção para um problema anterior: a criação de um perfil por uma criança menor de 13 anos -normalmente a idade mínima para a presença de jovens nas plataformas.
“Aí já começa o erro”, diz a delegada. “Ela não poderia estar nesse ambiente”.
Para ela, é preciso enfrentar a dificuldade da verificação etária para o acesso nas plataformas, que atualmente acontece de forma autodeclarada. Ou seja, mesmo com menos da idade mínima para usar a rede social, uma criança pode declarar ser mais velha para criar um perfil.
“Hoje é auto declaratório. Ela pode dizer o que ela quiser e ter acesso a um perfil na rede social. Já começamos o problema por aí: a responsabilização das empresas de verificar, realmente, a idade de quem está acessando”, afirmou.
Para a delegada, assim como a atuação de familiares e autoridades é necessário no combate aos crimes cibernéticos, as plataformas também precisam agir de forma coordenada na parte preventiva.
Embora Rafaella cite que algumas plataformas são colaborativas com investigações da PF, há aquelas que não têm tal perfil. No entanto, ela afirma que criminosos estão presentes em todas elas. “Eles estão onde as crianças estão”, diz.
A delegada aponta alguns exemplos de melhorias para as plataformas, como iniciativas de melhoria na verificação etária, além de tentar localizar e filtrar conteúdos criminosos e a consequente “derrubada proativa” -excluindo publicações claramente ilícitos ou inapropriados.
“Se uma criança de 13 anos procurando um tipo de conteúdo, e esse conteúdo é inapropriado -e qualquer um sabe o que é inapropriado hoje: conteúdos violentos, sexualizados, pornografia, discursos de ódio, misoginia, racismo, neonazismo, etc – se ela está procurando algo nesse sentido, não deveria voltar esse tipo de conteúdo para ela”, ressalta Rafaella.
O debate acerca do abuso sexual infantil nas redes ganhou maior relevância na opinião pública depois de um vídeo publicado pelo youtuber Felca, em que ele faz diversas denúncias sobre a “adultização” de crianças e adolescentes nas redes.
Em um vídeo de cerca de 50 minutos, Felca denunciou casos como o de Hytallo Santos, por sexualizar menores em postagens nas plataformas.
Como mostrou a coluna, cibercrimes envolvendo jovens na internet tem cada vez mais acendido um alerta das autoridades, que veem um crescimento desses casos em redes como o Discord, mas também em plataformas alternativas e ambiente de jogos virtuais – que muitas vezes passam ao largo de moderações.
A Polícia civil de São Paulo, por exemplo, monitora atualmente cerca de 702 suspeitos de cibercrime, além de contabilizar 148 vítimas salvas por operações e monitoramento das redes.
A PF também tem números altos de operações nesse sentido. No ano passado, segundo a corporação, foram mais de 2 mil inquéritos abertos sobre o tema, além de mil operações. Nesse ano, já são aproximadamente 1.200 inquéritos abertos.
Segundo a delegada Rafaella Vieira, a maior quantidade de operações hoje da PF é direcionada à área de combate ao abuso sexual infantil.
“O trabalho de repressão hoje é muito bem feito. Melhoramos muito a qualidade do trabalho para termos boas sentenças, que é o que nos interessa também dentro desse processo de criminalização desse tipo de conduta”, afirma.
Segundo ela, contudo, é importante prestar atenção não apenas no combate repressivo a esses casos, mas também na prevenção. Na PF, esse trabalho é feito por meio do projeto “Guardiões da Infância”, em que agentes do país inteiro, de forma voluntária, ministram palestras e levam mais conhecimentos a jovens, familiares e educadores sobre o problema.
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