Moradores tradicionais denunciam falta de diálogo e risco à subsistência

Durante o período mais crítico da pandemia de COVID-19, quando audiências públicas presenciais estavam suspensas por razões sanitárias, o governo brasileiro autorizou um dos maiores projetos de exploração de petróleo em águas ultraprofundas da história recente. Trata-se do Campo de Bacalhau, na Bacia de Santos, operado pela estatal norueguesa Equinor em parceria com a estatal chinesa CNPC.
O problema? A única audiência pública foi realizada de forma virtual, em agosto de 2021. Para as comunidades caiçaras, tradicionais habitantes do Litoral Norte de São Paulo, isso significou um apagamento de seus direitos à consulta prévia, livre e informada — direito garantido pela Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), da qual o Brasil é signatário.

As comunidades atingidas — que vivem da pesca artesanal e têm suas vidas profundamente conectadas ao mar e à floresta — alegam que não foram informadas adequadamente sobre o escopo do projeto, os impactos ambientais previstos e as medidas de mitigação. “Nunca vieram aqui”, relatou uma das lideranças ouvidas pela Repórter Brasil.
Avanço sem diálogo
O projeto foi aprovado pelo Ibama sem que fossem realizados estudos específicos sobre os impactos cumulativos na costa norte paulista. Ambientalistas alertam para a fragilidade do processo de licenciamento ambiental em áreas sensíveis como essa, onde já existem pressões intensas devido à urbanização desordenada, turismo de massa e especulação imobiliária.
De acordo com a Equinor, todas as etapas seguiram os protocolos legais. Mas, segundo juristas e organizações sociais, a legalidade formal não anula a ilegitimidade da ausência de participação popular efetiva.
Mais que petróleo
Além da ameaça direta à biodiversidade marinha e à pesca, o projeto simboliza um modelo de desenvolvimento que passa por cima de saberes locais, ignora modos de vida sustentáveis e enfraquece comunidades que há séculos vivem em equilíbrio com o território.
Para os caiçaras, o petróleo pode até ser uma riqueza nacional, mas a sobrevivência das famílias no litoral depende do mar limpo, dos peixes abundantes e de políticas públicas que respeitem sua cultura.
Fonte: Repórter Brasil – Adaptado por Ricardo Severino
Imagem: Divulgação/Repórter Brasil